O ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Gonçalves Dias, pediu demissão do cargo na tarde desta quarta-feira (19), após a divulgação de imagens que colocam em xeque a atuação do órgão durante o ataque golpista de 8 de janeiro.
A saída dele do governo ocorreu pouco depois de uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que aceitou o pedido de demissão. Trata-se da primeira queda de ministro na atual gestão, três meses e 19 dias depois do começo do mandato.
A crise que levou à saída do chefe do GSI teve como estopim a divulgação, pela CNN Brasil, de imagens do circuito interno da segurança durante a invasão da sede da Presidência da República que mostram uma ação colaborativa de agentes com golpistas e a presença de Gonçalves Dias no local.
O destino do general foi selado em meio à recusa de divulgar imagens da invasão ao Planalto. Uma semana após os ataques de 8 de janeiro, o governo divulgou vídeos editados, em particular com trechos que evidenciavam que os militantes eram aliados de Bolsonaro. No entanto, recusou um pedido da Folha, via Lei de Acesso à Informação, para divulgar a íntegra das gravações.
A queda do comandante do GSI deve tornar inevitável a criação de uma CPI no Congresso sobre os atos golpistas, que já vinha sendo cobrada pela oposição sob resistência da gestão Lula, que agora deverá mudar de estratégia.
A relação de amizade entre o general Gonçalves Dias, chamado de GDias pela equipe do governo, e Lula é antiga. Foi o militar que chefiou a segurança do petista durante seus dois primeiros mandatos (2003-2010), atuando como uma espécie de sombra em agendas no Brasil e no exterior.
Lula decidiu nomear o ex-interventor da segurança no Distrito Federal Ricardo Cappelli para comandar interinamente o GSI.
Segundo as imagens da invasão ao Planalto, os golpistas receberam água dos militares e cumprimentaram agentes do GSI durante os ataques. Nos vídeos, o próprio general Gonçalves Dias circula pelo terceiro andar do palácio, na antessala do gabinete do presidente da República, enquanto os atos ocorriam no andar de baixo.
Após a divulgação, Lula convocou reunião emergencial com aliados próximos para discutir a situação. Participaram o vice-presidente Geraldo Alckmin e os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Rui Costa (Casa Civil) e Flávio Dino (Justiça), além do diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues.
Nesse encontro, saiu o entendimento de que Gonçalves Dias deveria pedir demissão.
Logo após o pedido de demissão, a Secretaria de Comunicação da Presidência divulgou uma nota na qual busca responsabilizar "equipes remanescentes" do governo anterior por eventuais falhas durante o 8 de janeiro.
"A violência terrorista que se instalou no dia 8 de janeiro contra os Três Poderes da República alcançou um governo recém-empossado, portanto, com muitas equipes ainda remanescentes da gestão anterior, inclusive no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que foram afastados nos dias subsequentes ao episódio", diz o texto.
O governo ainda afirma que as imagens do dia do ataque estão em poder da Polícia Federal, que está investigando o caso e realizando prisões seguindo decisões judiciais. Acrescenta que, após autorização do STF (Supremo Tribunal Federal), vem investigando militares possivelmente envolvidos nos episódios, inclusive com novas detenções.
"Dessa forma, todos os militares envolvidos no dia 8 de janeiro já estão sendo identificados e investigados no âmbito do referido inquérito. Já foram ouvidos 81 militares, inclusive do GSI. O governo tem tomado todas as medidas que lhe cabem na investigação do episódio", afirma a nota.
Em discurso no evento de posse do conselho de participação social na elaboração do Plano Plurianual, Lula reforçou a mensagem de que todas as pessoas que participaram das invasões serão julgadas.
"Nós não deixaremos de julgar cada um dos golpistas porque nesse país não existe espaço para nazista, para fascista e para quem não gosta de democracia", disse.
Ainda na tarde desta quarta, o general Dias disse em entrevista à Globonews que sua estratégia no 8 de janeiro era levar todos os invasores para o segundo andar do Planalto, onde seriam presos.
O ex-ministro diz ser um "absurdo para a sua imagem" associá-lo a um agente do GSI que ofereceu água aos vândalos; e que ele colocou seu cargo à disposição, embora esteja "muito triste", para que a investigação seja feita. "Estou muito triste, coloquei meu cargo à disposição do presidente da República para que toda a investigação seja feita", afirmou.
Antes da demissão, o GSI divulgou nota afirmando que realiza investigações internas sobre a conduta de seus agentes durante a invasão do Palácio do Planalto.
O órgão dizia que a atuação no caso foi, "em um primeiro momento, no sentido de evacuar os quarto e terceiro pisos do Palácio do Planalto, concentrando os manifestantes no segundo andar, onde, após aguardar o reforço do pelotão de choque da PM/DF, foi possível realizar a prisão dos mesmos".
A pasta também afirmou, a respeito da colaboração de agentes com os invasores, que "as condutas de agentes públicos do GSI envolvidos estão sendo apuradas em sede de sindicância investigativa instaurada no âmbito deste ministério".
"Se condutas irregulares forem comprovadas, os respectivos autores serão responsabilizados", completou.
Gonçalves Dias era esperado para comparecer nesta quarta à Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados para prestar esclarecimentos sobre o 8 de janeiro. De última hora, após a divulgação das imagens, o general alegou problemas de saúde e cancelou a sua participação.
O GSI esteve largamente associado ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nos últimos quatro anos. O então chefe do órgão, general Augusto Heleno, nomeou militares de sua confiança que carregavam um grande sentimento antipetista.
Esse foi um dos motivos pelos quais, ainda durante a atuação do gabinete de transição, a equipe de Lula tenha decidido passar a segurança oficial do presidente do GSI para a Polícia Federal.
Gonçalves Dias depois tornou-se alvo de duras críticas internas devido aos ataques golpistas de 8 de janeiro. Aliados apontaram que houve inação do GSI durante as invasões no Congresso, no Planalto e no STF.
O governo buscou afastar de si a responsabilidade pela destruição promovida pelos bolsonaristas, transferindo o foco para falhas que ocorreram na força de segurança do Distrito Federal. Com isso conseguiu diminuir a pressão que havia sobre o general.
Dias buscou na sequência intensificar a "desbolsonarização" do GSI, substituindo dezenas de militares nas primeiras semanas do governo, além de trocar o número 2 do órgão, o general Carlos José Russo Assumpção Penteado, apontado como homem de confiança e muito próximo a Heleno.
O GSI, no entanto, seguiu na mira dos ministros palacianos. O próximo passo foi a retirada da alçada do órgão da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), que passou para a estrutura da Casa Civil.
Folha se são paulo
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